PORTO ALEGRE...ANTES e AGORA......SURPREENDENTE !!!   PARTE DA REPORTAGEM DO JORNAL ZERO HORA SOBRE O FUTURO DO CENTRO DA CIDADE E A ORLA DO GUAIBA Porto Alegre- A cidade pisa no GuaÃba ITAMAR MELO Porto Alegre tem uma relação tão conturbada com o GuaÃba que avançou sobre ele e ainda construiu um muro para escondê-lo. Os aterros que triplicaram o tamanho da área central, produzindo melhorias, mas também efeitos adversos, são o tema de hoje da série sobre a degradação do Centro. O conjunto de reportagens, que se iniciou no domingo e se completa na sexta-feira, aponta caminhos para socorrer o coração da capital gaúcha. A expansão do centro de Porto Alegre ocorreu pela transformação de água em concreto. Aterros realizados junto à s margens do GuaÃba durante mais de um século triplicaram a área da penÃnsula e modificaram em tal grau o desenho da cidade que ele não seria reconhecido hoje por um morador de cem anos atrás. As centenas de hectares aterrados também deixaram um legado sombrio: favoreceram a traumática enchente de 1941, incentivaram a separação entre a população e o GuaÃba por meio de um muro e comprometeram o futuro uso como balneário do trecho de orla que se estende até a Praia de Belas. A região central era originalmente um morro estreito que se projetava para dentro do GuaÃba, tendo como cume a atual Duque de Caxias. As margens iam até a Rua da Praia, na face norte, e a Washington LuÃs, no lado sul. A demanda por novos espaços originada do crescimento da cidade e a necessidade de qualificar o porto desencadearam a realização dos aterros - primeiro promovidos por particulares interessados em valorizar seus terrenos, mais tarde planejados pelo poder público. Com as vantagens, eles trouxeram conseqüências negativas, que ainda reverberam no cotidiano de cada morador da cidade. Por ter sido feita na mesma cota da margem, a imensa área plana entre a Sete de Setembro e o GuaÃba tornou-se vulnerável a inundações. Os porto-alegrenses não demoraram a perceber isso. Na célebre enchente de 1941, a região aterrada ficou submersa. - Se não houvesse aterro, não haveria enchente em 1941 no Centro - acredita a professora da Faculdade de Arquitetura da UFRGS Célia Ferraz de Souza, que estuda o desenvolvimento urbano da Capital. Como conseqüência, a necessidade de proteger a região aterrada levou à construção do muro da Mauá, que divorciou o Centro e o GuaÃba em 1974 e serviu de ingrediente na receita que deteriorou a região. O geógrafo CÃcero Castello Branco Filho, que concluiu em 2005 dissertação de mestrado sobre a orla, aponta outro efeito nocivo dos aterros. Realizados com terra retirada do fundo do GuaÃba, eles deixaram imensos buracos no leito, do cais até a margem do Parque Marinha do Brasil. Mesmo que o trecho seja despoluÃdo, não será seguro para banho. - Se fosse possÃvel secar o GuaÃba, verÃamos buracos muito profundos preenchidos por lodo e lixo - diz. O vento teve um papel decisivo na história dos aterros e acabou por condicionar o atual contorno do Centro. A força com que ele soprava do Sul estimulou a ocupação no Norte, mais protegido - tornando obsoleto o nome da Rua da Praia ainda na metade do século 19, quando uma área roubada ao GuaÃba deu origem a uma nova via ribeirinha, a atual Sete de Setembro. - Do lado sul da penÃnsula havia muito descampado, mas não existia o interesse em crescer para lá por causa do vento. Além disso, o porto era melhor na margem norte - diz a professora Célia Ferraz de Souza. Os aterros realizados ao longo do século 19 explicam a Praça 15. Ali, então margem do GuaÃba, funcionou entre 1844 e 1870 o mercado da cidade. Quando ele ficou pequeno, aterrou-se a área em frente para construir-se o atual Mercado Público. O prédio antigo foi demolido e abriu um vazio que se transformou em espaço público de lazer. Os aterros fariam uma cirurgia plástica na fisionomia do Centro no alvorecer do século 20. Em 1907, Porto Alegre disputava com São Paulo o tÃtulo de segunda cidade brasileira com maior produção industrial, atrás do Rio de Janeiro. Alargar a superfÃcie serviu para modernizar o porto Enquanto a Capital paulista detinha 15% da produção nacional, a gaúcha tinha 14%. Um cais condizente com a condição de pólo exportador era necessário no GuaÃba. Somavam-se a isso a decisão federal de modernizar os portos, vistos como propagadores de doenças, e o interesse da administração do Estado de tornar Porto Alegre um cartão de visitas. Em 1914, o Plano de Melhoramentos municipal projeta o novo cais e prevê o avanço em direção ao GuaÃba por mais dois embelezados e modernos quarteirões, cortados por largas avenidas: Siqueira Campos, Júlio de Castilhos, Mauá. O cais Mauá é inaugurado em 1921. Apesar dos efeitos adversos, os aterros permitiram a modernização do porto, concederam espaços para a expansão da área central e facilitaram o acesso à região. Capital O projeto que falhou O maior aterro da história de Porto Alegre riscou uma bela enseada do mapa com a ambição de criar um bairro residencial de alto padrão e de integrar o GuaÃba à cidade. Fracassou em ambos os objetivos, legando uma gigantesca área inacabada que afastou a orla do cidadão e que ainda luta para se integrar à vida da cidade. A intervenção, na margem sul do Centro, começou em 1956 e, em 1978, atingiu 200 dos 300 hectares previstos. Abrange a região que vai da Rua Washington LuÃs até o Arroio Dilúvio e da Rua Praia de Belas até a costa. A proposta de uma zona residencial em terreno criado sobre o GuaÃba foi apresentada em 1938 por Edvaldo Pereira Paiva e Ubatuba de Faria. A Praia de Belas era uma região estagnada. A abertura da Borges de Medeiros, entre 1924 e 1943, ligara ao Centro aquele ponto de tÃmido desenvolvimento e criara as condições para seu aproveitamento e para a integração da zona sul à cidade. O plano definitivo do aterro e do bairro ficou pronto em 1953, foi aprovado por lei em 1955 e apareceu inscrito no primeiro plano diretor da cidade, de 1959. Previa marina pública, tratamento paisagÃstico e requintado balneário junto a uma baÃa artificial. A partir daÃ, desenrolou-se a novela da incapacidade porto-alegrense de desfrutar o GuaÃba. Se no Centro há a desculpa do muro para proteger contra as cheias, na margem sul verificou-se o mero abandono dos projetos. - Poucos foram os quarteirões que saÃram como o previsto. Na medida em que aterrava, a prefeitura percebeu que não ocorria uma comercialização dos lotes como a prevista. A saÃda foi mudar a destinação do aterro. No final, essa grande obra ficou inconclusa - diz a arquiteta e professora da PUCRS Maria Dalila Bohrer, autora da dissertação de mestrado O aterro Praia de Belas e o aterro do Flamengo. O insucesso do plano deduziu, em 1961, cem hectares da área a ser aterrada. Lei de 1970 revogou o projeto do novo bairro Praia de Belas. Optou-se por criar dois grandes parques: o MaurÃcio Sirotsky Sobrinho e o Marinha do Brasil. Este foi motivo de concurso em 1976. O projeto vencedor previa aquário, cais turÃstico, bar flutuante e ilha artificial - jamais realizados. Visitante lamentou a mudança na paisagem O geógrafo CÃcero Castello Branco Filho avalia: - A área aterrada ainda é uma zona pouco utilizada, não incorporada plenamente ao espaço urbano. Hoje a região tem um uso interessante para a cidade, mas gerou um impacto negativo na paisagem. Ilhas foram engolidas pelo aterro e perdeu-se uma bela baÃa. Às voltas com uma infinidade de hectares sem função, as autoridades levaram para lá órgãos públicos, como o Centro Administrativo e a Câmara. Segundo o professor de história da PUCRS Charles Monteiro, a remoção de repartições ajudou a degradar o Centro a partir dos anos 70. O jornalista e escritor Carlos Reverbel gostava de relatar a reação que o aterro gerou em um antropólogo norte-americano que esteve em Porto Alegre durante as obras. - Vocês estão estragando uma das paisagens mais bonitas do mundo. É pena que não se possa comprar a paisagem e transportá-las para paÃses que saibam admirá-las e preservá-las. Capital A alternativa: Ousadia contra o muro O GuaÃba pode salvar o centro de Porto Alegre. A conversão do cais em área de lazer é apontada como remédio para atrair público diferenciado, produzir movimento noturno e renovar o bairro. Arquitetos e urbanistas consideram incontornável substituir o muro da Mauá por outro tipo de proteção contra cheias. - É decisivo derrubar o muro, ou não faz sentido ter projeto para o porto. Encontrar alternativa de proteção não é problema técnico nem significa gastar muito. O obstáculo é o medo que as autoridades têm de tomar a decisão - diz Carlos Maximiliano Fayet, ex-presidente regional do Instituto dos Arquitetos do Brasil. Capital A alternativa: Resta urbanizar a orla O aterro pode ter sido um equÃvoco, mas agora que é uma realidade nada justifica seu abandono. A solução consiste em urbanizar a orla, dotando-a de equipamentos como calçadões, bares, rampas e estacionamento. A professora de Arquitetura Maria Dalila Bohrer propõe um concurso público para a escolha do projeto. - PoderÃamos criar um grande área de lazer entre a Usina do Gasômetro e a Fundação Iberê Camargo, passando pelo Anfiteatro Pôr-do-Sol. Isso qualificaria a orla e justificaria fazer um aterro tão grande. Já que a modificação existe, vamos valorizá-la - diz. > |
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