Sunday, April 15, 2007

Urbs - A cidade que abandonou a si mesma (Entrevista com Roberto Pompeu de Toledo)

A cidade que abandonou a si mesma

O jornalista Roberto Pompeu de Toledo não é especialista em nada, a não ser — como os jornalistas se definem a si mesmos — em generalidades. Mas é uma daquelas instâncias a que os responsáveis por decisões complicadas, principalmente de governo, sonham discretamente em sempre consultar. É que esse paulistano de 56 anos, criado nas Perdizes e morador de uma rua arborizada próxima ao Centro, tem a rara qualidade jornalística de perceber — e valorizar — o centro do que verdadeiramente interessa: a verdade luminosa mas banal, perfeita mas comezinha e cotidiana, na parafernália das falas oficiais e do vozerio impresso e televisado, como faz semanalmente na última página de Veja e, vez por outra, em reportagens especiais na mesma revista. Profissional com longo histórico em diversas publicações, por três anos correspondente em Paris e tido como um dos melhores textos da imprensa brasileira, Roberto freqüentemente se engalfinha com a São Paulo que ama (e critica) sem uma benevolência que enxerga, por exemplo, nos ricos, prontos a tolerar que os pobres maltratem a cidade como compensação para a dignidade que ela e suas elites lhes confiscam. Ana Maria Ciccacio, editora assistente, e Jule Barreto, editor de urbs, selecionaram trechos de uma longa conversa com o jornalista, em fevereiro.

urbs - A cidade parece ter encerrado um ciclo catastrófico e pode estar pronta para um grande salto, para recuperar oito anos de desgoverno, abandono e pilhagem. Não lhe parece um disparate que, segundo uma pesquisa recente da Folha de S. Paulo, 61% dos paulistanos se mudariam da cidade se pudessem?

Roberto Pompeu de Toledo –Em Paris ou Londres o resultado não seria muito diferente. As pessoas gostariam de sair mas não significa que vão sair. É claro que São Paulo tem muito mais problemas do que outras cidades, inclusive do Brasil. Mas, na hora do vamos-ver, você vai sair mesmo? Não vai. Esse tipo de pesquisa, ou pesquisite, serve mais para desinformar do que para informar. Uma bobagem.

Segundo outra pesquisa, no mesmo jornal, a personalidade pública que mais tem a cara de São Paulo é o ex-prefeito Paulo Maluf. Não esclarece qual cara, a abominável ou a positiva, a boa ou a ruim. Voltando ao assunto, o parisiense, o catalão de Barcelona também tem a nostalgia do campo. Vai para lá nas férias e duas ou três semanas depois já está querendo voltar.

É isso. Independentemente da qualidade de vida e dos serviços que oferecem, as grandes cidades são fontes de inquietações muito maiores do que os locais de férias da pessoas. O indivíduo sai de Paris, vai tomar leite de vaca tirado na hora na Normandia, vai para a Côte DÂ'Azur, que maravilha! É claro que ele gostaria de deixar Paris, mas isso é outra história. Ele não vai conseguir levar outro tipo de vida. Na verdade, declara que quer mudar, mas não quer de fato.

No caso de São Paulo, essa declaração parece corresponder a uma irritação ou revolta, a uma demanda reprimida, como se o cidadão quisesse mas já não pudesse se identificar com a cidade.

Se as cidades fossem entes aos quais se pudesse aplicar uma psicanálise, uma psicoterapia, você detectaria em São Paulo um problema de descentramento. O problema de identidade paulistano está em que a cidade não sabe onde é o seu centro. Da mesma forma que as pessoas, as cidades e os seus espaços precisam estar centrados. E o centro de referência, o self de São Paulo, é o seu Centro histórico.

Por que esse desgarramento em relação ao Centro?

Houve um equívoco enorme, por várias razões que não cabe citar aqui. Há um erro imenso toda vez que que uma cidade abandona o seu centro. É como abandonar a si mesma. São Paulo seguiu um modelo perverso que vem das cidades americanas, menos de Nova York, onde Manhattan sempre foi e continua sendo o centro. Gostamos de copiar as coisas erradas dos Estados Unidos, no caso o abandono dos centros e a suburbanização. As coisas certas, como a reversão desse processo, que já está acontecendo lá, não copiamos.

Tampouco copiamos as cidades européias.

Imagine se Paris vai abandonar seu núcleo central, ou Londres, ou Roma, ou Madri! É inimaginável que deixem de ser elas mesmas. São Paulo cometeu a loucura de abandonar o Centro e correr atrás da utopia maluca de construir outra cidade na Avenida Paulista, depois na Faria Lima, na Berrini e sabe-se lá mais onde.

E agora paga um alto preço, não?

Muito alto, inclusive no que diz respeito à auto-estima, à noção de referência das pessoas. Eu vejo as gerações novas, as de meus filhos, que têm 30 anos, não conhecerem as ruas do Centro, não saberem onde fica a Rua Líbero Badaró, a Marconi. A São Bento talvez até saibam, mas precisam pensar um pouco... É um absurdo o abandono do Centro durante a noite. Vira uma cidade fantasma, assustadora. E não se trata só da violência, do medo. Você simplesmente declara morta uma realidade — morreu, é cidade fantasma, foi abandonada pelos seus habitantes e ponto final. É isso que você percebe quando visita o Centro depois das oito da noite.

Como mudar isso?

É fundamental encontrar modos de ocupação noturna do Centro. Um deles é o uso residencial, tem se falado muito nisso. Mas é preciso transformar o Centro num grande lugar de encontro, com restaurantes, bares, teatros e muito mais.

Escolas...

Uma boa idéia que ouvi recentemente, creio que do João Sayad (secretário municipal das Finanças e Desenvolvimento Econômico), propõe uma universidade municipal no Centro.

Outro secretário da atual gestão, Jorge Wilheim, do Planejamento Urbano, defende a idéia de um pólo universitário aproveitando edifícios ociosos ou decadentes na área mais antiga do Centro, o Triângulo.

A mais fantasmagórica dessas ruas é a Álvares Penteado, onde há diversos prédios vazios, alguns deles muito bonitos. Não são ocupados nem de dia nem de noite, é espantoso. Isso exigiria uma intervenção decidida do poder público e da iniciativa privada, o que também levaria a uma reforma na cabeça das pessoas, para que elas se reconciliem com o Centro da cidade, principalmente as gerações mais novas. Para que o Centro volte a ter a função que todos os centros de cidade têm, que é centrar, devolver a centralidade. Nem falo de Paris, que é uma utopia de cidade — ninguém vai repetir Paris. Falo de Jundiaí, que não conheço bem, mas que deve ter uma relação dos moradores com a cidade, e com o centro, muito mais afetuosa e saudável que São Paulo.

No mínimo menos complicada e ambígua.

Muito menos. O Rio de Janeiro também sofreu o mesmo processo de fuga do centro, lá você tem uma representação gráfica dessa fuga ainda mais dramática, um caminho em direção ao sul com o abandono de cada etapa da fuga para as pessoas desamparadas. Mas o Rio, pela boa relação dos seus moradores com a cidade e graças a administrações municipais muito mais felizes do que as nossas, acabou se reencontrando com o seu centro, aquilo que se espera que São Paulo agora faça. É evidente que no Rio foi mais fácil porque o centro carioca tem maior valor histórico e arquitetônico.

Mas centro metropolitano não é só patrimônio histórico. O de São Paulo tem uma grande vantagem sobre o do Rio, a presença das bolsas de valores e de futuros, de um pólo de negócios, de empresas que usam tecnologias da informação. Nosso patrimônio histórico é humilde, mas o centro do Rio, fora um patrimônio riquíssimo, não tem uma economia dinâmica que sustente, sozinha, a requalificação urbana. O de São Paulo tem, está desperdiçado.

O centro do Rio foi ou ainda é sede de estatais, da Petrobrás, do BNDES. Teve até há pouco uma bolsa de valores. É, ou foi, uma economia que ajudou a ancorar a região.

O Rio foi capital do Império, da República até 1960, ganhou instituições, palácios, museus, monumentos e parques que São Paulo nunca teve.

São Paulo sempre foi capital de província. Em qualquer país, a capital nacional recebe mais investimentos públicos, embelezamento. É onde estão as sedes do governo e do parlamento, os tribunais, as embaixadas, onde se fazem as homenagens aos heróis da Pátria, os panteons, tudo isso em geral nos centros.

O Rio sempre foi muito dependente do Estado.

E também Recife, Salvador, Belém, até Belo Horizonte. A história de São Paulo está vinculada à iniciativa privada, não ao Estado ou à Corte. Nossa origem é privada, o que desde o início difere São Paulo das cidades litorâneas. Ela foi feita no meio do mato por aventureiros e caçadores de índios. Um lugar absolutamente hostil ao europeu. São Paulo esqueceu o Estado e foi esquecido por ele durante muito tempo. Experimentou um desenvolvimento paralelo e divergente. Rio, Recife e Salvador foram centros de maior progresso durante o Império, enquanto São Paulo só se torna uma cidade importante no final do século XIX, por volta de 1870, graças ao café.

E depois com a indústria.

Sim — mas só quase quatro séculos depois! Até então foi uma cidade absolutamente secundária, distante dos principais centros do país, para não dizer do mundo, e esquecida pelos investimentos públicos. São Paulo fez-se por si. Essa história muito diferente explica alguma coisa do que hoje é a cidade, uma certa tendência à provisoriedade que você nota em todas as etapas da sua história.

Um acampamento, mais que uma cidade?

Um ponto de passagem, um trampolim para o sertão. No século XIX foi passagem para os estudantes da Academia de Direito.
São Paulo foi ameaçada de morte várias vezes, ressurgia por golpes do acaso. Vivia da caça de índios até que se descobriu ouro no século XVII, houve um tremendo esvaziamento, os paulistas foram todos para Minas e outras regiões, São Paulo se tornou um vilarejo...

De mulheres.

Já era, ficou menor ainda. Ressurgiu com a faculdade de Direito, que veio para cá em 1827 em meio a forte oposição — como as elites podiam mandar seus filhos para aquele lugar? São Paulo parecia condenada a ser tão só uma vila de estudantes até que mais uma vez fomos salvos por um golpe de sorte, quando o café migra do Vale do Paraíba rumo ao oeste da província. A cidade vira um pólo importante, embora ainda sofrendo ameaças. Se hoje São Paulo rivaliza, pelo menos em tamanho, com as grandes cidades do mundo, durante muito tempo foi comparada com Santana do Parnaíba. No século XIX, sua rival era Campinas. São Paulo só não perdeu porque era era um caminho mais fácil para o porto de Santos.

A crise ou insuficiência recorrentes da esfera pública em São Paulo não decorre disso?

Em tudo São Paulo é mais incorreto. Para o bem ou para o mal, nossa tradição privatista é maior do que a de qualquer lugar do Brasil. O lado bom disso é a menor dependência do Estado. O ruim é uma espécie de hipertrofia dessa tendência de querer resolver tudo sem o coletivo. A exacerbação disso é Alphaville, um anti-modelo de cidade que pretende resolver todos os seus problemas sozinho e que se dane o resto.

Mas seus moradores e usuários não querem pagar pedágio para usar uma rodovia construída pelo Estado a pedido principalmente deles.

Acho o cúmulo reclamarem do pedágio. Foram eles que se instalaram lá, que debandaram. Acham o valor do pedágio uma exploração. Depois que o poder público foi sobrecarregado com o custo de uma nova estrada, porque a primeira era insuficiente para atendê-los, não querem pagar para usá-la. Mas a decisão de romper com o poder público é deles. Quem vai morar em Alphaville talvez não tenha consciência — mas é preciso ter — de que está rompendo com a coletividade e abrindo mão da segurança pública, da escola pública, do hospital público. Então que paguem por isso. Querem uma ferrovia? Paguem-na.

Não é a mesma lógica do shopping center?

Há uma diferença fundamental. No shopping o pobre não entra, mas não há controle ostensivo, já está implícito que não é lugar de pobre. Em Alphaville é explícito: tem que apresentar documentos, justificar o acesso. Mas não é algo exclusivo de São Paulo. É uma tendência não digo mundial, mas pelo menos americana.

A recuperação do Centro seria um contrapeso a essa tendência a segregar e isolar-se?

O Centro é democrático. É uma espécie de cruzamento de todo mundo, pobre e rico. A rua do Centro é assim, pertence a todos. Nosso desejo é que o Centro recuperado vá contra essa privatização da cidade. E que induza a uma sociedade mais homogênea, a uma cidade mais harmoniosa.

Tem-se esperança na ação de uma Prefeitura honesta e competente, na vontade e pressão dos segmentos sociais dinâmicos e, por que não, num colapso da utopia isolacionista. A privatização se dá nos extremos. Sai o rico, entram o camelô e o sem-teto, e vice-versa. A classe média procura se isolar como pode. Um dia, para não desaparecer, ela terá que lutar pelo espaço, pela escola, pelo hospital, pelo transporte públicos.

Bem, privatização se confunde com segregação. Em São Paulo os pobres estão num lugar, os ricos em outro, e o máximo que se encontram é quando a empregada cruza com o patrão. Outros encontros não existem. Um anda de carro, outro de ônibus. Vão a escolas e hospitais diferentes. Qual a utopia? Para onde caminhar? A grande meta seria as classes médias voltarem a frequentar a escola pública, a usar o hospital público, o transporte público. Os serviços teriam que melhorar. O usuário desses serviços, hoje, é basicamente o pobre, que não tem cacife para reclamar. A qualidade do ensino público é um exemplo. Vai melhorar à medida em que as classes médias estiverem presentes. Porque, hoje, não é só a falta de cacife político a responsável pelo abandono do equipamento e do serviço público, mas também a inexistência de condições de avaliá-los. Os desprovidos de educação não podem avaliar se o filho está sendo ou não bem educado na escola.

Então essa mescla de pobres, remediados e classe média é um objetivo a ser perseguido?

Cada um no lugar dos outros, essa é a solução. E nesse sentido está se desenhando, aqui, uma situação de segregação ainda pior do que, digamos, no Rio de Janeiro. Lá pelo menos existe a favela incrustrada no meio da cidade. É um problema enorme, claro, mas o pobre está muito mais próximo. Mora-se em belíssimos prédios em São Conrado e a favela da Rocinha está logo ao lado. Já em São Paulo são cada vez mais raros os bairros com populações mistas. O ideal seriam populações mistas por toda parte. Seria um modelo de cidade.

E o camelô, como fica? Deve ou não ocupar a cidade toda, inclusive o Centro, como acontece hoje?

Todo mundo fala no camelô. É complicadíssimo. Mas qual é o problema do camelô? Vejam que paradoxo: vender bugigangas na calçada é ilegal mas, no fundo, o enorme problema de consciência das classes privilegiadas brasileiras impede que seja aplicada a lei.

Explique.

A consequência dessa má consciência das elites por seus muitos privilégios é o afrouxamento da lei. Se você não garante trabalho e renda adequada às pessoas, não lhes dá condições de ir à escola, de ser atendidas no hospital, de morar decentemente, você lhes dá o quê? Permissividade. Você tolera o camelô nas calçadas, a invasão de terrenos por desabrigados. Tolera favelas em lugares absurdos, como a que existe na confluência do Tamanduateí com o Tietê. Essa tolerância é a compensação que as elites oferecem aos pobres.

Os dois rios de que você falou não são rios, mas canais de esgoto.

Isso me leva a um outro tema, a má relação de São Paulo com as águas. Não falo dos mananciais. Estou pensando nos rios. São Paulo é uma das duas únicas — depois eu digo qual a outra — cidades do mundo onde os rios que as cruzam são feios. Em todo lugar o rio é uma maravilha, dá ordem à cidade. A ponte é a alegria do arquiteto. Já em São Paulo é tudo muito feio, os rios, as pontes.... Eu achava que São Paulo era caso único, até conhecer Juiz de Fora. O que eles fazem com o Rio Paraibuna é ainda pior.

São Paulo sempre deu as costas para os rios?

Às vezes se dão as costas ao rio porque a cidade fica distante dele. Nunca foi o caso de São Paulo. Na origem havia o Anhangabaú, o Tamanduateí, e a relação era boa. A má relação começa com a explosão da cidade, depois daquela data que já mencionamos, 1870, quando a urbanização encosta no Tietê..

Até em décadas mais recente, os rios eram limpos, úteis. Forneciam água, havia regatas no Tietê...

Davam paisagem, horizonte, pontos de referência, ordenamento. As cidades se ordenam ao redor do Sena, do Tâmisa, do Prata. O Rio de Janeiro se ordena ao redor da baía, do oceano, da lagoa. E São Paulo tem uma carência enorme de pontos de referência. O medo que as pessoas de fora têm da cidade vem menos de seu gigantismo e trepidar frenético e mais da dificuldade de se orientar e locomover aqui. Os rios nos fariam um bem imenso se não os tivéssemos afogado. O que acontece com o Tamanduateí é espantoso. Vocês já viram que ele está preso entre grades, entre vigas que o atravessam? Encarceraram o rio, já não fosse ele feio, sujo, já não existisse aquele tampão de concreto...

O paulistano também faz isso com as árvores. É o mesmo fenômeno?

É a mesma falta absoluta de cuidado, seja com os rios e a vegetação ou com qualquer tipo de embelezamento. Vejam só a quantidade de pneus que se jogam nos rios. É de assustar. Por que nos rios? Mas a relação da cidade com as águas era outra no passado. Ainda há reminiscências disso. A Ladeira Porto Geral tem esse nome porque conduzia a um porto no Tamanduateí, perto da atual Rua 25 de Março.

Como dar início a um movimento, a um grande esforço para recompor a ruptura entre o paulistano e sua cidade? Como recuperar a boa relação entre ambos?

Há que começar pelo poder público. Por mais que a tradição de São Paulo seja privatista, por mais que a capacidade de investimento público esteja comprometida, tem que ser por iniciativa e sob a liderança dele. E por poder público entenda-se Prefeitura. É dela o papel de mobilizar a opinião pública, fazer com que as pessoas se agreguem para que as coisas aconteçam.

Como você enxerga a disposição da mídia de participar dessa empreitada?

Houve um tempo em que se procurou federalizar ao máximo a cobertura da imprensa, e isso em parte ainda acontece. Foi até compreensível se levarmos em conta os problemas que o país teve, hiperinflação, planos econômicos, moedas novas, com a conseqüente superexposição de ministros da área econômica. Essa cobertura tem que ser feita, mas se chegou a um ponto em que ela passa a encobrir e prejudicar a cobertura local e regional. Em São Paulo, mais do que no Rio, foi evidente esse fenômeno de relegar as notícias da cidade para os fundos da edição. Pouco se dá de importância ao prefeito e menos ainda à Câmara Municipal, a não ser recentemente, ainda assim em função dos escândalos. Nesse ponto, o de chamar a atenção da mídia para o prefeito e a Câmara, o (ex-prefeito Celso) Pitta deu uma grande contribuição, será um prefeito inesquecível (risos). Um enorme holofote foi colocado em cima dele e dos vereadores e eu percebo que uma boa parte dessa moçada, desses repórteres, continua em cima dos problemas da cidade. Estão cobrindo a Marta (Suplicy, prefeita), embora ela seja uma novidade, é mulher etcétera. Quero crer que não seja só por isso, mas por seus projetos. A televisão está fazendo uma cobertura que não havia antes, em especial o SP TV (da TV Globo) do meio-dia. Nele há uma boa cobertura dos escândalos, mas também das necessidades e carências da população. Eles põem a câmera à disposição da comunidade e cobram resultados.

Nos jornais, o noticiário local e metropolitano está melhor e mais amplo.

Mas o noticiarismo puro não conduz a nada. E preciso debater, discutir a cidade. Da mesma forma como já temos, às pencas, pensadores da economia analisando e debatendo na mídia, devemos trazer para ela os pensadores da cidade e a reflexão sobre os problemas urbanos.

Você é capaz de dar exemplos de relações de amor ou ódio, não da população, mas de prefeitos com a cidade?

Lembrei-me da Marta Suplicy pintando o Pacaembu, em janeiro. E gostaria de repetir o que costumo dizer sempre, que Paulo Maluf destesta São Paulo. Tenho duas evidências disso. A primeira é a construção daquela via elevada, o Minhocão, claramente uma monstruosidade. A segunda é a destruição, pela administração Maluf, da concha acústica que existia no Estádio do Pacaembu.

Onde está hoje o chamado tobogã.

Ela dava toda a graça arquitetônica do estádio. Além de ser o elemento mais elegante, mais distintivo e característico, a concha acústica fechava a ferradura do estádio e hoje seria muito mais útil do que o tobogã, porque o Pacaembu é talvez mais usado para espetáculos do que para futebol. Seria um palco formidável. O que eu tenho a dizer é o seguinte: ponham abaixo esse tobogã e reconstruam a concha acústica.

E o Minhocão?

Em várias cidades do mundo as vias elevadas estão sendo demolidas. Uma das grandes idéias do Conde (Luís Paulo Conde, ex-prefeito do Rio de Janeiro), que ele não pôde realizar, previa a demolição do trecho da via elevada Perimetral que corta a Praça Quinze de Novembro, onde fica o edifício do Paço Imperial e que, como se pode ver em gravuras e fotos do século XIX, se debruçava sobre a baía. O imperador despachava a dois passos do mar e ia de barco para casa, em São Cristóvão. O elevado liquidou com essa vizinhança que se tinha do mar.

No entanto, a prefeitura conseguiu rebaixar o leito da avenida que corre sob o elevado, tirando o tráfego pesado da superfície. Talvez agora, com o prefeito César Maia, saia a solução definitiva. E o Minhocão, é o caso de demolir? Haverá resistência?

Provavelmente. Vão dizer que é uma obra muito grande, que é complicado ficar sem ela de repente. Mas por que não intervir nele, até mesmo demolir? É possível fazer muita coisa, sim. O Rio, pelo que você me conta, está fazendo.

http://www.vivaocentro.org.br/public...rbs/urbs20.htm>

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